Na contram�o da crise, imigrantes enxergam perspectivas no Brasil
Joana Almeida, 39, passou os �ltimos sete anos em uma batalha por estabilidade financeira. Ficou desempregada, viu o pr�prio neg�cio falir e teve que se desdobrar em bicos desgastantes, com baixo retorno financeiro.
A situa��o se encaixaria sem estranhamento num cen�rio brasileiro, mas se passou em sua terra natal, Portugal, de onde ela saiu em mar�o deste ano. "Eu at� sabia que havia uma crise brasileira, mas perto de como estava l�, n�o me assustei", diz.
Natural de Lisboa, Joana se formou em engenharia e, quando a crise de 2008 culminou, ficou desempregada.
Foi o impulso necess�rio para mudar de �rea. Fez um curso de gastronomia, passou por diversas cozinhas e, em 2013, abriu o pr�prio restaurante, que sobreviveu por um ano. Preenchia planilhas de contabilidade, incluindo at� as gorjetas, e todas as semanas eram iguais: movimento est�vel, mas escasso.
Para piorar, os impostos sufocavam o neg�cio. "Quando acabou o ver�o, me reuni com os outros dois s�cios e decidimos que seria melhor fechar as portas do que acumular d�vidas", lamenta. Joana partiu para uma jornada dupla: de dia, trabalhava em um caf�, e de noite, fazia salgados por encomenda.
"Eu me matava de trabalhar para conseguir o m�nimo. Nem para tomar uma cerveja com meus amigos eu tinha. Estava deprimida, n�o havia perspectiva de crescimento alguma. Tinha um amigo no Brasil e nada a perder. Ent�o, vim."
Raspou o tacho das economias, pediu dinheiro emprestado para os familiares e encontrou uma promo��o que cabia no bolso. "Pensei: � agora ou nunca", ri.
Joana � um exemplo que relativiza a crise vivida atualmente no Brasil. Apesar do �ndice de desemprego crescente, imigrantes que deixaram pa�ses em situa��o grave, seja econ�mica, seja pol�tica, enxergam possibilidades e vantagens para suas vidas aqui.
Dados do Miss�o Paz, um centro de acolhida de imigrantes ligado � Igreja Cat�lica e que funciona desde a d�cada de 30 em S�o Paulo, mostram um fluxo constante de estrangeiros atendidos em 2014 e 2015. O n�mero de contrata��es, por�m, n�o acompanhou essa tend�ncia e caiu de 2.739 em 2014 para 776 at� setembro de 2015.
O malinense Adama Konate, 34, no Brasil desde 2012, colabora para a redu��o do desemprego. Desde abril, pouco depois de conseguir o Registro Nacional de Estrangeiro, emprega quatro africanos no restaurante Merci Ma M�re, que abriu no Br�s (centro de S�o Paulo), com comidas t�picas do Mali.
Mais do que um neg�cio, a inten��o � que o espa�o desempenhe uma fun��o social para a comunidade africana da regi�o. Al�m de pre�os acess�veis, o restaurante tem cabines para fazer liga��es internacionais e lavanderia. O investimento ainda n�o se pagou por completo, mas Adama afirma que o movimento � crescente e que serve de 80 a 100 pratos por s�bado.
"Eu sa� do Mali para estudar. Um dia vi uma palestra de um professor que pesquisava a escravid�o africana. Ele contou sua viagem pelo Brasil e fiquei encantado. Minha fam�lia queria que eu fosse para os EUA, mas os convenci que passaria uns meses aqui antes.
Quando cheguei, n�o quis mais sair. Fui o primeiro africano a se formar em contabilidade no Senai. Fiz outros cursos e hoje quero ajudar meus irm�os que n�o est�o numa boa situa��o", sonha Adama.
Muitos malinenses deixaram sua terra natal como refugiados pol�ticos depois que o pa�s sofreu um golpe de Estado em 2012, instaurando uma guerra, que durou tr�s anos, at� mar�o deste ano.
O Mali, s�timo maior pa�s da �frica, se emancipou da Fran�a em 1960 e historicamente sempre foi uma zona de conflitos, por ser entreposto comercial da �frica negra e da �frica �rabe e por disputas de riquezas naturais, como ouro e ur�nio.
O malinense Boubou Sacko, 29, � cliente do Merci Ma M�re. Ele diz que a vida melhorou desde que chegou ao Brasil, h� um ano e meio. Est� empregado como montador e conta, animado, sobre as viagens a trabalho que j� fez pela Para�ba e pelo Rio Grande do Sul. Mora nas depend�ncias da firma, o que permite economizar boa parte do sal�rio para enviar � m�e e ao filho no Mali.
Joana est� igualmente feliz com sua situa��o aqui. Nesses sete meses, j� est� no segundo emprego, como ajudante de chef no restaurante Be Fresh, no Itaim Bibi, na zona oeste paulistana. O primeiro foi em uma padaria portuguesa no Bel�m, na zona leste.
"N�o esperava conseguir t�o r�pido", conta. "Ganho um pouco mais do que ganhava l�, mas aqui vejo um amanh�. Em Portugal nada cresce, n�o tem sa�da. O custo de vida em S�o Paulo � mais pesado, isso sim. Comida nem tanto, mas aluguel e transporte sim. Quero apostar no Brasil".
O atual emprego possibilitou que ela trocasse o visto de turista pelo visto de trabalho, v�lido por dois anos. Para os tr�mites do documento, voltou a Lisboa em agosto e diz que n�o sentiu a menor vontade de ficar. "Queria voltar logo para c�", confessa, sorrindo.
"Eu estava miser�vel, esse � o termo. Quando meus amigos me reviram, se espantaram de como eu era outra pessoa. Me disseram 'n�o volte!'".
L�GIA ROCA fez o 1� Programa de Treinamento em Fotojornalismo e V�deo da Folha, patrocinado por Friboi, Odebrecht e Philip Morris Brasil.