Governo Lula admite rever mudanças no BPC para reduzir resistência a pacote de corte de gastos

Número 2 da Fazenda diz que texto pode sofrer ajustes, mas ideia é preservar impacto fiscal das medidas

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Brasília

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, disse nesta terça-feira (10) que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pode rever as mudanças propostas no BPC (Benefício de Prestação Continuada) para reduzir resistências ao pacote de contenção de gastos no Congresso Nacional.

A medida tem sido criticada por diferentes bancadas, inclusive a do PT. O diretório nacional da sigla aprovou uma resolução política recomendando debate sobre as mudanças no BPC. Foi uma saída mais branda para evitar a aprovação de um texto crítico ao pacote anunciado no fim de novembro pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).

"O BPC tem uma preocupação da bancada do PT, que a gente entendeu e vai internalizar. A depender de como for, talvez seja possível fazer um ajuste ou outro menor para que a gente destrave a votação", disse o secretário após participar de encontro com parlamentares da FPE (Frente Parlamentar do Empreendedorismo).

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, durante entrevista à Folha na sede da pasta - Pedro Ladeira - 18.abr.2024/Folhapress

"[Pode haver] Ajustes menores, sem que a gente tenha perda de impacto fiscal. Então, preservando o impacto fiscal e corrigindo, eventualmente, algum conceito ou alguma imprecisão que tenha incomodado não só a bancada do PT, mas outras bancadas também", afirmou.

Na noite desta segunda-feira (10), Durigan e o ministro Wellington Dias (Desenvolvimento Social) estiveram com a bancada do partido na Câmara dos Deputados para tratar das medidas, em especial as que envolvem o programa.

O BPC é pago a idosos e pessoas com deficiência com renda de até um quarto de salário mínimo por pessoa (o equivalente hoje a R$ 353).

Uma das medidas do pacote amplia o conceito de família usado para analisar se alguém tem direito ou não ao programa.

A renda do cônjuge ou companheiro, mesmo que não more com a pessoa, passará a contar para a liberação do benefício. Renda de irmão, filhos e enteados, solteiros ou casados, também vão entrar no cálculo, desde que morem no mesmo lar que o requerente.

Na prática, o governo passaria a contabilizar a renda de mais pessoas, tornando mais fácil que o limite do critério seja superado —o que dificulta o acesso ao benefício. Durigan reconheceu que esse é um dos temas que despertou a preocupação dos parlamentares.

"Eles reconhecem que tem espaço para fraude, mas ao mesmo tempo pode impactar pessoas que de fato teriam direito", afirmou. "Se de fato tiver um medo de perda de direitos, a gente pode rever, acho que não tem um problema maior com relação a isso", acrescentou o secretário.

Na segunda, o ministro Wellington Dias já havia sinalizado a possibilidade de mudanças no BPC. "O Parlamento tem o poder de aperfeiçoar as propostas que aqui chegam", disse. O governo calcula uma economia de R$ 2 bilhões ao ano entre 2025 e 2030 com as alterações na política.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), saiu em defesa da proposta do Executivo, afirmando que o projeto que trata do BPC "visa aprimorar o benefício, combater as fraudes sem tirar nenhum direito de quem recebe". Ele disse que há um "desvirtuamento do debate" e que a proposta está sendo usada "para disputa política com a disseminação de fake news".

Em publicação nas redes sociais, Guimarães disse que o projeto conta com "amplo apoio de líderes de vários partidos" e ressaltou as assinaturas dessas lideranças na autoria da proposta.

Ele afirmou que a bancada do PT discutiu com técnicos da Fazenda três pontos acerca do BPC: o conceito de benefício, a composição da renda e a vedação de dois benefícios na mesma família.

"Estamos estudando medidas para aperfeiçoamento do projeto de lei que sejam capazes de impedir as fraudes, moralizar um benefício que muitas vezes, em face de decisão judicial de primeiro grau, é concedido a pessoas sem necessidade", escreveu. "Longe de nós do governo tirarmos direitos de quem quer que seja."

Nesta terça, Durigan disse também acreditar que medidas do governo para destravar o pagamento de emendas parlamentares devem contribuir para reduzir a tensão no ambiente político no Congresso Nacional.

O Executivo vai editar uma portaria interministerial para disciplinar regras de pagamento das emendas. Um dos dispositivos vai flexibilizar o prazo de apresentação do plano de trabalho para as transferências especiais (as chamadas emendas "Pix") em 2024.

Nessa modalidade, o dinheiro é transferido diretamente para os caixas das prefeituras e governos sem indicações de projeto. Sua liberação é considerada ponto sensível pelos parlamentares, e a exigência prévia de um plano de trabalho tornaria impraticável destravar as verbas de 2024, dada a proximidade do fim do ano.

A AGU (Advocacia-Geral da União) também vai publicar um parecer de força executória para interpretar os efeitos das decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre as emendas. A previsão é que as medidas sejam publicadas ainda nesta terça.

"Ontem [segunda-feira, 9] a equipe jurídica do governo passou analisando a decisão do Supremo e comunicando, tanto aos deputados e senadores quanto às áreas operacionais do governo, para dizer qual era a interpretação possível", disse Durigan.

"O timing está apertado. A decisão foi de ontem, ontem mesmo a gente teve uma série de conversas para esclarecer, então vai ter um parecer da AGU cumprindo essa força executória, indicando para as áreas operacionais o que pode ser feito. E, ao mesmo tempo, outros atos normativos e infralegais que vão operacionalizar o acordo que foi travado", afirmou.

Na avaliação do secretário, as medidas serão suficientes para aplacar a tensão com o Congresso. "Eu acho que tem um esforço de votação agora no fim do ano", disse.

Durigan afirmou ainda que o governo mantém a previsão de enviar ainda em 2024 o projeto de lei que trata das mudanças no Imposto de Renda. Junto com o pacote de contenção de gastos, o governo apresentou uma proposta de isentar quem ganha até R$ 5.000. A alteração valeria a partir de 2026, e a renúncia de receitas seria compensada pela criação de um imposto mínimo para quem ganha acima de R$ 600 mil por ano.

O anúncio teve repercussão negativa no mercado financeiro. Até agora, o projeto não foi oficializado pelo Executivo. "A previsão é que a gente envie este ano. Essa é uma decisão do presidente com o ministro Haddad, mas o projeto está pronto", afirmou o secretário.

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