Nos últimos dias, o Brasil liderou duras negociações globais sobre temas que, basicamente, definem nossa existência no planeta. No encontro do G20, no Rio, o país deu protagonismo à agenda de clima e de financiamento climático para as chamadas nações em desenvolvimento, referendada na declaração final dos líderes das maiores economias do mundo.
O grupo ainda mandou um recado à COP29, a conferência do clima da ONU, ao avalizar a reforma do sistema financeiro internacional para bancar a transição ecológica justa. Na cúpula, que se encerrou desgastada neste fim de semana em Baku, no Azerbaijão, os negociadores brasileiros foram peças-chaves para, ao menos, se fechar um número consensual na contenda entre países ricos e pobres sobre esse financiamento.
Ficou para o Brasil, que preside a próxima COP, em Belém, a responsabilidade pelo caminho para que os US$ 300 bilhões anuais definidos cheguem a US$ 1,3 trilhão em 2035, a cifra efetivamente necessária –enfim incluída no acordo como uma sinalização de rumo. Como o documento final fala em fontes diversas, inclusive privadas e contribuições voluntárias, viabilizar essa engenharia é o grande dever de casa para a COP30.
O esforço político e diplomático brasileiro em exercer uma liderança responsável na presidência do G20 e na COP onde, além de intermediar as negociações, foi um dos três países a divulgar a sua nova meta de contribuição para reduzir o aquecimento global (NDC, em inglês), ganha maior significado num contexto de guerras e crescimento da extrema direita.
Os dois eventos já deram mostras da potencial influência negativa do novo governo Trump nos EUA sobre a ambição climática e, mais ainda, sobre países negacionistas ou oportunistas. E é mais do que simbólico que, no plano nacional, as investigações da Polícia Federal tenham revelado a caixa de Pandora dos golpistas vinculados ao governo negacionista anterior.
Como reforcei na coluna passada, o extremismo precisa ser superado se queremos um planeta mais sustentável e justo. No xadrez geopolítico de um mundo cada vez mais fragmentado, o Brasil fez as jogadas possíveis em um tabuleiro adverso para continuar a partida.
Não que as posições brasileiras não devam avançar, como na falta de clareza sobre a transição para fora dos combustíveis fósseis. Ou que não seja urgente a reforma dos processos multilaterais, infiltrados por lobbies que atuam na contramão dos interesses globais definidos nesses fóruns. Baku, com seus 1.770 representantes do setor fóssil, tem de ser o último exemplar dessa distorção.
Mas, neste contexto, vale a máxima: se não nos unirmos pelo amor, que seja pela dor. Estamos todos sofrendo os impactos das mudanças climáticas. Precisamos das empresas que entenderam a oportunidade da transição e a sua dependência da natureza, dos governos, bastiões dessa liderança, e da sociedade civil, para pautar caminhos mais ambiciosos e cobrar as falhas nesse percurso.
Para os que não foram abduzidos por teorias da conspiração ou pela ganância que cega, o dever moral de agir precisa catalisar escolhas criativas. Para os que têm poder nas mãos, negar a ciência e as consequências práticas da inação é suicídio coletivo, mas não apenas – é assassinar nosso futuro.
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