O grande debate das redes sociais nesse momento de jogos olímpicos são a roupa das atletas. Mas, para além do debate estético, se as roupas agradam ou não os olhos da torcida, há muita coisa de fato importante a ser debatido sobre os uniformes das nossas atletas.
A Olímpiada de Paris é a primeira a ter equidade na quantidade de homens e mulheres competindo. O Brasil tem a maior delegação feminina da história com 153 mulheres representando 55% dos atletas brasileiros na disputa por medalhas. Um feito histórico que infelizmente acentua a discrepância entre a oferta de opções de looks esportivos entre gêneros.
Izabela da Silva, atleta de disco, fez um desabafo em suas redes assim que recebeu sua mala com os uniformes, contando que não recebeu uniformes femininos do seu tamanho, pois a modelagem vai só até o M. Ela recebeu peças do uniforme masculino que atendem o seu tamanho e ficou sem peças femininas como tops. Como ela mesmo falou “é um descaso isso que fazem com as atletas”.
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Mulheres não existem em um tamanho só, logo atletas existem em diversos tamanhos. E isso interfere não só no imaginário popular de quem pode ser uma atleta, mas também no incentivo às práticas esportivas. Mulheres são as que mais praticam atividades físicas, mas desde a infância são afastadas da prática de esportes. Muito porque alguns esportes acabam por transformar seus corpos em corpos mais fortes, musculosos, que ainda é visto como menos “feminino”. E a moda esportiva contribui para manter a mulher em posição de objeto, com roupas que deixam os corpos mais expostos e proporcionando menos conforto. A Izabela mesmo em seu relato afirma que se sente mais confortável com peças masculinas. Não é coincidência que as maiores influenciadoras da moda esportiva não são atletas de ponta e sim, cantoras.
Nas últimas Olimpíadas de Tóquio, lancei um report junto com a 65\10 sobre as roupas de atleta. Por mais que as tendências da moda feminina bebam das referências do esporte, e o estilo atleisure seja um dos que mais cresce no mundo, as atletas são muito mal servidas em roupas que de fato atendam às suas necessidades esportivas. A seleção feminina de futebol só teve uniforme próprio em 2019! E não são só as atletas brasileiras que enfrentam questões a respeito dos seus uniformes. O body da delegação de atletismo estadunidense também sofreu fortes críticas por serem cavadas demais como a Glamour mostrou na matéria Pódio Fashion da edição 139.
Pesquisas sobre a psicologia das roupas mostram que esse estado de alerta que as mulheres ficam quando suas vestimentas geram algum tipo de desconforto por revelarem demais ou não serem adequadas ao seu corpo “tem consequências como o monitoramento habitual do corpo e da aparência e requer esforço cognitivo que pode resultar em dificuldade no desempenho da tarefa”. Ou seja, para além da questão estética, os uniformes das atletas podem interferir diretamente no seu psicológico durante a performance delas nos jogos.
Nos últimos anos avançamos muito em tecnologia com shorts absorventes, chuteiras adequadas as necessidades dos pés femininos, flexibilização e enfrentamento das atletas para usarem roupas mais confortáveis para sua prática esportiva como as ginastas alemães em 2021 que optaram por competir usando macacões ao invés dos tradicionais bodys. Mas ainda temos muito que evoluir em tamanhos, funcionalidade e conforto das roupas esportivas para que elas contribuam positivamente para que as mulheres consigam focar apenas no que interessa: dar seu melhor na disputa por medalhas.
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Criadora de conteúdo há quase 20 anos, Carlinha é autora do livro Use a Moda a Seu Favor e acredita no potencial das mulheres de hackear as convenções de moda e usá-la como instrumento de aceitação e autoconhecimento para se viver melhor.